terça-feira, 30 de setembro de 2008
Sobre como estou sempre certo, e sobre como tudo que puder dar errado, dará.
segunda-feira, 29 de setembro de 2008
Intorno a Dante (Io stesso)
Non ho mai scritto niente qui, così. In questa lingua. Dante. Voglio parlare di lui. Non de l'autore, ma dell'altro Dante. Quello, della Commedia. Qui sono i versi:
Nel mezzo del cammin di nostra vitaNon direi di nostra. Ma di mia. La mia vita. Però non mi ricontro per una selva oscura. Sono la selva oscura. La notte, il mio tutto. Io. Mi mancano le parole. Anche la mia dirita è stato sempre smarrita. Cosa posso fare? Le cose sono semplicemente così. E saranno, per tutto il sempre. Pensavo che questa lingua era più calorosa. Non lo sento qui. Anche qui, le cose, le parole, sono fredde. Non voglio dire più niente. Vorrei potere cambiare le cose. Non posso. Devo accettare. Solamente. Comme se si tratasse della verità.
mi ritrovai per una selva oscura
ché la diritta via era smarrita.
domingo, 28 de setembro de 2008
Companheira inexorável
Ela. E tinha que ser feminina. Vem quando menos espero. E aindassim sinto sua aproximação. Migraine. Mine. Migrando para lugar nenhum. Latente. Espera. Agora. Aqui. Comigo. Pulsa. Incomoda. Para me lembrar de minha condição: homunculóide. E de que o fim está à porta. Cada dia, um dia a menos. Os meus: abreviados. Não se vai longe assim. Agulhas? Entorpecentes? Ansiolíticos? Retardar o inevitável. Só há uma certeza.
La vie est une page vide.
E não sabemos escrever. Quiséramos. Todas as línguas, e no entanto: desentendimento. Tudo isso é equívoco. Equivocatio. Quanto mais línguas falo, mais me calo. Trabalho inútil. A ânfora se quebrou. A torre caiu. Quero tudo. Busco tudo. Leio tudo, como o Autodidata. Meu tudo: nem tão tudo. Depois da Literatura: o vácuo. O vácuo é ilegível. A Literatura não diz nada. Ainda mais depois de Shakespeare. O que havia para ser dito, foi. O resto: balbucios, lamentações, circunlocuções. No fim, é preciso ser seletivo. Estou cansado. À procura do inincontrável. Le vide. La vie. De que adianta a suavidade do francês? O calor do italiano? A aspereza do alemão? A jovialidade do inglês? A eloqüência do português? O arcaísmo do grego? No fim, calo-me. Do que digo: nego. Dizem-me calado. Que posso dizer? A vontade de falar: ecfráctica, aperiente. Eu mesmo: tateio, cego, às escuras, em busca de uma parede em um descampado. Porque não em versos? Não dá. E porque não em página, papel branco, palpável, concreto? Não posso. O vazio se expressa no vazio. A página que quero preencher: vazia, persiste. O fado: não conseguir o que quero, ter o que não me interessa. O que resta: prostituição intelectual. Vender-me barato, ao primeiro que vier. Voltar atrás? Não dá. Os dois pés já caminharam para o vazio. A queda é livre. Acabou a irreverência.
Why the hell not?
Pós-Porra Toda? Putaria. Pós-porra nenhuma.
Tá. 20 e tantos anos. E eu. Falando merda. Disse alguma coisa? Quanta prepotência. Mudei tudo. Porra nenhuma. Mudou nada. Mudar a porra toda é uma contradição em si. Leia-se: Octavio Paz. Ruptura? Não. Tradição. Tradição? Não. Ruptura. Então como mudar? Não dá, porra. Só se tem aparência. Disso. Daquilo. Poesia é aparência. Não é porra nenhuma. E isso aqui? Porra nenhuma também. Fuck it. Quem se importa? Alguém lê essa merda? E se lê? E se leram isso aí em cima? Poemimagem? Poemimerda. Pós-isso. Ultra-aquilo. Multi-porra toda. Quer ser alguma coisa? Serás porra nenhuma.
Isso é um manifesto? Serviram pra nada: prova do fracasso. No fim, só falta entender isso: o único sucesso é o fracasso.
Poema morto
nascente efêmera morte
que se esvai no vão vindouro
da eterna vida penitente.
Fui da morte filho pródigo
esquecido em lugar ermo
padecido das mil dores
da eterna vida penitente.
Fui de lugar ermo alçado
às altas vias letéias
condenado à extrema dor
da eterna vida penitente.
[Outro decrépito. Abrindo as tumbas. Deixando sair os mortos-vivos. 2006]
sábado, 27 de setembro de 2008
Tropeço
[Outro texto moribundo. Jogo-o de volta à vida. Agonizante. 2006. Ano morto].
Un coup de dés jamais n'abolira le hasard
O acaso, aí: na impossibilidade de se fazer entender. Impossibilidade gerada pelo e no acaso. À mercê do acaso, além do apócrifo, perto de si: o vero. E o lance de dados não pode aboli-lo, senão confirmá-lo. Nada mais é do que isso: enfiar-se de corpo inteiro no imprevisto do acaso. Aceitar suas imposições. Prestes: conseqüências inimagináveis. O acaso.
Decidir a sorte em um lance de dados: mergulhar no abismo da incerteza . No fundo: única certeza. Paradoxal que seja. A certeza da incerteza: nada mais certo do que isso. No fundo mesmo deste abismo: a pieuvre, feminina, faminta, falaz: encarnação animal do abominável, no mais obscuro momento do inconsciente: nós mesmos. Inocentes e despóticos. Do alto desta superioridade sólida e firme como um castelo de cartas empilhadas ao acaso. Descobrimos, por fim: o fim.
Édipo: arrancolhos. Ilusão de cegueira. Mas a crueza do que é certo ultrapassa o orgânico: os olhos ainda mais abertos. Atentos. Impassíveis. Nada lhes escapa: sem pálpebras. Não se cansam de enxergar. Perturbam-nos. Os que quisera fechar, sempre: o trágico do acaso. Inabolível. O imperativo: manifestação abrupta. Essa, sua força: o inesperado. Imprevisto. Contra o qual nada se pode. Do qual nada se sabe.
Jamais abolir o acaso. Entregar-se a um lance de dados: entregar-se ao acaso do acaso: capitular. Fatos: impossibilidade de predição. O oráculo: sonho. Trabalho onírico. Fruto dos restos do dia, do acaso. O oráculo: impossível.
You Can't Always Get What You Want, But...
You just might get what you never thought you would. Mesmo à distância. Do que parece tudo. Do objetivo. Do desejo. Do que não parece possível. Das mãos, tudo ao alcance. Mas parece que não. Parece frio. A Durande pode estar no rochedo. E o resgate: suicídio. Mas deve-se morrer. Ou não se nasce novamente. Ou: vive-se duas vidas. Na expectativa (não esperança) de que uma morte chegue. Princípio e fim só são antônimos no dicionário. E, claro, it's all fucked up, então, que há a perder? A insatisfação? A falta de desejo? O diálogo monológico? Tudo vai de bom grado. E isto já está discursivo demais.
sexta-feira, 26 de setembro de 2008
Baco. Poco, ma Baco.
Baco. Dio del vino. Διώνυσος. Prazer. Coito. Bebida. Lascívia. Luxúria. Fertilidade. Seu pai: não Zeus, mas Caravaggio. Em Διώνυσος: a necessidade do homem. O animalesmo. Melhor: humanesco. O que se quer apagar. Se esconde. Se oprime. Se nega. Mas o que somos: prazer, luxúria, lascívia. Não só carnal. Nem tanto carnal. Também: intelectual, egocêntrica. Em Caravaggio: perfeição da forma. MascoFeminino. Sombra. Luz em Διώνυσος. O resto: sombra. Escuridão. Frutos da embriaguez. Nas mãos de Διώνυσος. À mesa. Ao alcance. No olhar vago, o convite. No convite, a tentação. Do embate entre Διώνυσος e Ἀπόλλω, a tragédia. Forças antagônicas. Complementam-se nele, άνθρωπος. E ele, άνθρωπος, é o princípio e o fim. Mas é menor do que si mesmo. Como disse. Mais que um deus grego, menos que uma besta. Ele, άνθρωπος.
Negri e o equívoco
La guerra diventa un operazione di polizia, di polizia universale, globale. Porque foi preciso. O homem é lobo não do homem. Mas de si próprio. Vigilância. Necessidade de sobrepujar. E sobrepujar é: sobreviver. Tutto è semplicemente: luta por vida.
... sono capacità di nation building. Sim. Nações se constróem sobre nações. Lei natural. É preciso morrer para nascer. Para ser, é preciso deixar de ser.
... que dominano le populazione estremamente miserabile, sia a New York o a Los Angeles, che a Johannesburg, che a New Delhi. Sempre. E que mal há? Felizes os fortes, porque deles é o reino do mundo.
La lotta per la fine delle malatie, per la fine della miseria, la capacità di transformare, di metamorfosare l'uomo, de modo che la miseria della morte se allontane, la miseria, la tragedia della morte. Porque afastar a morte? Porque o trabalho de Sísifo? Para que tentar mudar, metamorfosear? E o resultado disso: sempre o mesmo: repetição do ciclo.
Tutta la filosofia, da Platone fino Heidegger, ha sempre sustenuto che la morte è una parte essenziale della vita. É. Para viver, preciso matar. Enriquecer a vida? Com o quê? Só há nadas. Névoas nadas. Vaidades. Enriquecer? Não, iludir.
La costruzione di una resistenza non è semplicemente un atto morale, un atto etico, dovuto, naturalmente, sempre per le persone libere, ma è anche una necessità, che nasce del fatto che, se si vuole lavorare bisogna essere insieme, si vogliamo produrre bisogna essere insieme. O problema: o insieme. No insieme, a resistenza. Nisso tudo: o nada. O absurdo. Ausência de sentido. Inalienável ausência de sentido.
quinta-feira, 25 de setembro de 2008
Sobre a moral e os bons costumes
Não existem fenômenos morais, apenas uma interpretação moral dos fenômenos.
Sim. Tudo é moral. Nada é a moral. Tudo não passa de sombras. Más leituras. Ou desleituras. Tudo em prol de si próprio. Mas como escapar? Aceitar é moral. Fugir é moral. Negar é moral. Isentar-se é moral. Fechar os olhos é moral. Calar-se é moral. Falar é moral. Quero sair, mas não tem como. Querer sair é também moral. Então: fracasso. Único resultado possível. Acabou o sonho. I have a dream, Luther King. Foda-se. Deu em quê? Porra nenhuma. A mesma merda que aí está, com novas vestimentas. Trocou-se o pão velho pelo leite azedo. Propósito? Não. Digressão. Que tenho a oferecer? Nada. Que preocupações tenho? Nenhuma. Nada é problema meu, a não ser eu mesmo. Leia como quiser. Não me interessa. O melhor de tudo é ler Beckett.
Dreizehnten Juni, eintausendneunhundertzweiundachtzig
O dia. Princípio do fim. Contagem regressiva. Cada dia, um dia a menos. Enquanto isso, acumulo um monte de nadas. Nadas acontecem a todo momento. Nada muda sem parar. Incrivelmente perdido. Queria dizer que two roads diverged in a yellow wood, mas as roads, para mim, não são duas. Para todo lado. Só o que vejo. Pobre Frost. Qual é the one less travelled by? Todas igualmente ermas. Inexploradas. Se alguém já passou por ali, não interessa. Se eu não, então ninguém. E assim a História se repete, como Sísifo, na danação eterna. Somos Sísifo. No equívoco da astúcia. Na falta de sentido na eternidade. A certeza: o caminho acaba em penhasco a qualquer instante. Em meio ao nevoeiro, caminho. O passo em falso: o porvir. O porvir: inevitável. E a pedra não nos espera. Já está aqui. Dia após dia. Mas ela não está no meio do caminho. Em verdade vos digo: sendo rolada morro acima.
Transladar-se
levar uma parte
à outra parte.
Assim como é certo
poder ver de perto
como aquela arte
traduz-se (sorte?)
de morte em vida
de parte em arte.
[Setembro, 2006. Quando a poesia ainda era possível]
Adelfo
Depois de refletir sobre por onde deveria começar, se pelo meu nome, se por minha aparência, ou por qualquer outra coisa que o valha e que seja de praxe colocar em textos desta natureza decido simplesmente colocar-me sentado num banco, à beira da praia, e isso deve bastar a si mesmo, mas o banco, é preciso dizer, não está virado para a imensidão vazia do mar, tão passível de contemplação em seu movimento incessante, seu trabalho incansável, não posso me colocar contemplando algo tão magnífico porque nada há de mim ali, e por isso coloco-me a olhar para a avenida à minha frente, ornada de belos prédios residenciais, com suas varandas amplas e suas vidraças que emanam luz, opulentas, olhos de apartamentos ocupados por aqueles que provam o seu mérito e que os exibem como troféus da luta ganha, nesta mesma avenida onde pessoas ocupadas vão e vêm nos seus carros, nos seus ônibus, com suas alegrias, com suas paixões, com suas infelicidades, com seus problemas, com suas contas para pagar, com os filhos que não lhes obedecem, com os filhos que ainda não têm, mas que pretendem ter, ou que sabem que nunca terão, ou que não querem ter, ou que tiveram mas foram obrigadas a abandoná-los em um lugar qualquer, ou a se livrar deles antes mesmo que tivessem a chance de respirar este ar misto do gás do escapamento dos veículos e da brisa que vem do mar, isso que me mantém vivo, agora. Talvez fosse melhor se o banco estivesse virado para a imensidão vazia do mar, pois esta imensidão vazia eu poderia preencher como quisesse, com aquilo que me vem à cabeça, com aquilo que pretendo, com o que deixo pra lá, com tudo que me faz ser eu mesmo. Mas o mar é simplesmente uma imensidão vazia que nada tem a ver comigo, já estava lá antes de mim e continuará ali, no seu trabalho incessante, depois que nos formos todos, essa massa tão imensa que eu não posso preenchê-la, e por isso prefiro colocar-me de costas para ela, fitando a avenida e o seu ocupado vai-e-vem que não me nota, porque ele e eu fazemos parte de uma outra imensidão, vazia como o mar, mas vazia de um outro vazio.
E eu aqui, no banco, em meio ao vazio disto tudo, não sou notado pelos viandantes por terem eles outras preocupações, ocupações ainda que saiba que também, talvez, não os notasse, se também eu tivesse minhas ocupações. Na verdade, não há importância aí. O que importa agora é estar aqui no banco, por que o tempo é curto. Importa simplesmente saber que, se olho para os lados, há todo um formigamento inconsciente ao meu redor, que se chama vida. Inconsciente por que não se sabe massa, formigamento. E eu sou parte disso tudo. Sou uma formiga, velha. Então me levanto, e dou um passo em direção a qualquer lugar, porque não importa aonde vou, e caminho à toa, desocupado, despreocupado, pois sei o que será da minha vida nos próximos dias, nos próximos meses, nos próximos anos, se ainda os tiver tão próximos de mim. Agora não importa mais, não, agora meu papel está cumprido e não tenho mais obrigações a não ser esperar pelo dia em que...
[Novembro, 2006. Texto moribundo. Esquecido. Empoeirado. Tiraram-se as teias de aranha e jogou-se de volta no mundo.]
Ich und Er
Dois meros nadas. Pensamos. Pra quê? Ele, fitando o vazio. Eu, a página. A página: o ser. Olho para compreender. Ou tento. Só sobraram as páginas. Hamlet, ao responder Polonius:
Polonius: What do you read my Lord?
Hamlet: Words, words, words.
Nietzsche olhou para o lado errado. Direção errada. Portanto, eu, a página. Nelas, só isso, nada mais: Words, words, words. Frutos de quem? De quê? Que dizem? Dizem? Não seria mero disfarce? Falar é cegueira. Organizar o pensamento, estupidez. Cerco-me deles. Para ouvir. Se falo, é comigo mesmo. O cúmulo da razão: falar consigo, ouvir a si mesmo, e discordar. Esbravejar. Vociferar. Baldoar. Apostrofar. Entrar em luta. Corporal. Para, no fim, o nada. O preto no branco. E a conclusão: cinza. Um século depois. A mesma indagação. O mesmo escrutínio. Resultado: espere mais cem anos e veja.
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
E no fim? Será o que? Da palavra. Tudo. De tudo: a palavra. O fim, o silêncio. A não-palavra. Não mais cegueira. Mudez. Quero em não-palavras. Unword me God. Recusa da palavra, recusa da criação. Nem Verbo, nem Substantivo, nem Adjetivo, nem Advérbio. Talvez Preposições. Dois mil e oito anos depois. E rarefazem-se as palavras. Rarefaz-se a criação. Não há vida senão pelo Verbo. Não há existência senão pelo Verbo. Portanto: Literatura. Só se existe nos livros. Dico, ergo sum? Não. Dubito, ergo sum? Não. Cogito, ergo sum? Não. I am not. Je ne suis pas. Io non sono. Ich bin nicht. Eu. A sombra de mim mesmo. Como Lear. A sombra do que não fui. Do que não sou. Como seria um "Ensaio sobre a Mudez"? Radicalizar. Queria dizer: reduzir ao animismo. Todavia: reduzir ao humanismo. Palavras demais.
terça-feira, 23 de setembro de 2008
Sabedoria ímpar.
Well, I went to the doctor
I said, "I'm feeling kind of rough"
"Let me break it to you, son"
Your shit's fucked up."
I said, "my shit's fucked up?"
Well, I don't see how-"
He said, "The shit that used to work-
It won't work now."
I had a dream
Ah, shucks, oh, well
Now it's all fucked up
It's shot to hell
Yeah, yeah, my shit's fucked up
It has to happen to the best of us
The rich folks suffer like the rest of us
It'll happen to you
That amazing grace
Sort of passed you by
You wake up every day
And you start to cry
Yeah, you want to die
But you just can't quit
Let me break it on down:
It's the fucked up shit.
Let me break it to you son: your shit's fucked up. Dá pra ser mais claro? Talvez Celan tivesse querido essa dádiva. Acabou o lirismo idiota. Acabaram-se as metáforas, metonímias, alusões perdidas em intelectualismo hermético. Não se precisa de mais debates crítico-teóricos. Fudeu a porra toda. Now it's all fucked up. It's shot to hell. Porque essa porra toda é um absurdo mesmo. É nadar pra morrer na praia, quando se consegue tanto. Mas e daí? You want to die, but you just can't quit. Há razão? Teimosia. Menos que uma besta. Menos que Hamlet, Gilliatt, Cubas, Coriolano, Meursault, Macbeth, Iago, Fausto, Borba, Casmurro. Muito menos que ele: Shandy.. E mais. Muitíssimo menos que ele: o Fool de Lear. It's a fucked up shit. O Fool já sabia disso. E só resta escrever à toa. Quase meia-noite. Aula amanhã cedo. E eu aqui, falando merda. It'll happen to you. Cedo ou tarde. Quando não se espera. Isso não é niilismo, nem é um cachimbo. My shit's fucked up? Pra que a surpresa? Já deveria saber do que está por vir.
E é por isso que eu penso o seguinte:
Sobre o que se pode e o que não se pode dizer, e as implicações disso tudo para a filosofia, a vida, o sapado justo e a calça rasgada na hora errada.
Lasciate ogni speranza voi ch'intrate.
segunda-feira, 22 de setembro de 2008
Salvador Dalí e eu de cá.
El gran masturbador. Ele, Dalí. Eu, de cá. Tu, de onde estiveres. Persiste a memória. A memória que esquece de tudo. Pelo menos a minha. Esquece, mas persiste. Sono e mescla. Grasshoper without hope. E tudo se funde em si mesmo. Em nada. Le rêve. Rever o sonho para ver o que não vê. Homem só, ao fundo em direção ao nada.
E tudo isso na ponta do nariz. Quasifelação quasimodesca. Em meio ao sentido de tudo isso, o absurdo. Porque só restou isso depois de Auschwitz. Disseram que não dá mais pra escrever depois de Auschwitz. O mesmo que dizer que não dá mais pra pintar, ou compor, ou aproveitar o ócio. Foda-se quem disse isso. Quem disse que dava pra escrever, ou pintar, ou compor antes de Auschwitz? Não sou anti-semita. Mas não estou nem aí pro Holocausto. Não foi o primeiro, não foi o único, não será o último. Porque essa é a condição humana, o fado, a danação depois da queda. O orgulho de si mesmo. A liberdade que só há no sonho, porque o resto é aprisionamento e depressão, orgulho e desgosto, debater-se em meio à água fria do rio que não tem correnteza, nem margens, muito menos uma terceira margem. Só o que restou, depois da queda, foi o vazio, que só o sonho preenche. E no sonho, diante da liberdade, tudo se permite. Melhor viver no sonho do que ir embora pra Pasárgada, voltar para Ítaca, ou encontrar o tempo perdido. It's all fucked up anyway. Let us dream. Let us be. Fuck it all. Estaria tudo de cima para baixo? De baixo para cima? Pelo avesso? Ao contrário? É muita falta do que fazer. E pensar que tudo isso está na ponta do nariz.
Was aber Schönheit sei, das weiß ich nit
Rien à voir, rien à penser, rien à dire.
On Nietzsche.
146. Quem combate monstruosidades deve cuidar para que não se torne um mostro. E se você olhar longamente para um abismo, o abismo também olha para dentro de você.
Queria saber como isso soa em alemão... Ah. A net. Por um momento me esqueci que ela tem (quase) tudo. Em meio ao mar de tralha e desperdício de espaço virtual, aqui está o Nietzsche na língua de Hitler (ou de Goethe, se preferir):
146. Wer mit Ungeheuern kämpft, mag zusehn, dass er nicht dabei zum
Ungeheuer wird. Und wenn du lange in einen Abgrund blickst, blickt der
Abgrund auch in dich hinein.
Que abismo é esse? Tanta gente já deve ter feito essa pergunta idiota e eu to fazendo a mesma coisa. Porra. É o óbvio.
O abismo está na ponta do nariz. Mas a gente tem medo de olhar pra ponta do nariz. Ou pro umbigo. Tanto faz. É pq sabemos que o abismo tá ali. Se pudesse tiraria meu nariz fora para me livrar do abismo. Todavia ele deve continuar ali pra não me deixar esquecer. E se ouso olhar pra ele, ele oha de volta, e o que eu vejo é o reflexo do espelho.
domingo, 21 de setembro de 2008
Domingo. Domenica. Dimanche. De nada. Sunday. Sonntag. Sem sentido.
Dando continuidade ao propósito de mostrar que, não importando o que possa parecer, all our shit is fucked up, estou eu aqui, em pleno domingo, trabalhado e, em meio ao trabalho, aproveito a folga que dou a mim mesmo, com uma dor de cabeça filha da puta que voltou a fazer parte do meu dia-a-dia nos derniers jours, escrevendo. Escrever já virou verbo intransitivo, porque a vida é intransitiva. Talvez reflexiva. Pode ser que dê no mesmo. Mas a vida é sem objeto, nem direto, nem indireto, nem disfarçado, nem descarado. Ma che bello: non sai dire altra cosa. Sim. Não sei. Non ho bisogno. Voilà, c'est tout.
Mas eu ainda não terminei. Vou terminar isso daqui, terminar o que tenho de fazer, reler Macbeth, talvez algo de Harold Bloom ou Kermode sobre a peça para a aula de amanhã e, no fim das contas, chegar à mesma conclusão de antes: o homem é tão grande que se perde dentro do próprio umbigo, como o Thane escocês. E cego, para ecoar o filme de ontem. Ecco come stanno realmente le cose. Così. Lá se vão alguns séculos desde que Macbeth foi escrito e nada mudou. Nor shall it change. E às vezes tenho a impressão de que estou trilhando o mesmo caminho.
Pra terminar, falas da peça, de Macbeth, diante da notícia da morte de sua esposa, memoráveis, frutos que só a elizabethan age poderiam dar:
Out, out, brief candle!
Life's but a walking shadow, a poor player
That struts and frets his hour upon the stage
And then is heard no more: it is a tale
Told by an idiot, full of sound and fury,
Signifying nothing.
sábado, 20 de setembro de 2008
(In)Certeza Sobre a Cegueira
Pois bem. Ao filme. Confesso que não li o livro. Deveria ter lido, lerei, mas não li ainda. Que tenho a dizer sobre ele? É estranho e sintomático que justamente no dia que tenha decidido começar o blog roubando a idéia de uma música do já morto Zevon, o filme mostre como all that fucking shit is really fucked up. É. Disse recentemente numa aula qualquer que, ao MEU ver, a literatura serve pra isso (se é que serve pra alguma coisa): mostrar pra nós mesmos, por menos que queiramos, ou possamos, ou aceitemos, ou nos neguemos a ver, que somos os únicos filhos da puta responsáveis por toda a merda que aí está. Quer dizer que não tem mais jeito? Vá saber. Acho que tem. Mas não importa o que eu acho. A história está aí pra provar o contrário. Ou provar que estou certo. Ou as duas coisas ao mesmo tempo, sei lá se é a mesma coisa. Que diz o filme? Que um cachorro consegue ser mais civilizado e humano que qualquer um de nós (nenhuma novidade até aí). Somos bestas arrogantes, caídas, perdidas em meio a um mar de sarcasmo, futilidades, aparências, posses, todos cegos diante da própria danação. E não pensem que sou pessimista. Não sou. Aí alguém diria, "Ah, vá se fuder! Até parece que não é..." Viu? Se tua reação foi essa, você é só mais um deles, como eu, como qualquer outro. Não é porque estou escrevendo aqui, do conforto do meu quarto e da minha cadeira acolchoada e com rodinhas que me acho acima de todo mundo porque eu digo que estão cegos. Também estou no mesmo barco. Todos estamos. Se não se está no barco, morre-se afogado, debatendo-se inutilmente à procura da ilha que não existe. Pronto. Viram? Digredi novamente e não falei porra nenhuma do filme. Mas não to nem aí. É isso. Acho que serve. Se te servir, desocupado leitor, pago-me da tarefa; se não te servir, pago-te com um piparote. E adeus. (Plagiando Machado descaradamente. Mas o que há a fazer?)
A propósito, o velho aqui em baixo, pra quem não conhece, é o dito cujo, Saramago.
Why the hell "My shit's fucked up"?
Et vive la philosophie du FODA-SE!!!
Pra quem não conhece a música, tá aqui o link do grande mestre Zevon - que a propósito já tá comendo capim pela raiz, já que como o próprio disse numa música, "Life'll kill ya" - "My shit's fuckedup".