domingo, 28 de setembro de 2008

La vie est une page vide.



E não sabemos escrever. Quiséramos. Todas as línguas, e no entanto: desentendimento. Tudo isso é equívoco. Equivocatio. Quanto mais línguas falo, mais me calo. Trabalho inútil. A ânfora se quebrou. A torre caiu. Quero tudo. Busco tudo. Leio tudo, como o Autodidata. Meu tudo: nem tão tudo. Depois da Literatura: o vácuo. O vácuo é ilegível. A Literatura não diz nada. Ainda mais depois de Shakespeare. O que havia para ser dito, foi. O resto: balbucios, lamentações, circunlocuções. No fim, é preciso ser seletivo. Estou cansado. À procura do inincontrável. Le vide. La vie. De que adianta a suavidade do francês? O calor do italiano? A aspereza do alemão? A jovialidade do inglês? A eloqüência do português? O arcaísmo do grego? No fim, calo-me. Do que digo: nego. Dizem-me calado. Que posso dizer? A vontade de falar: ecfráctica, aperiente. Eu mesmo: tateio, cego, às escuras, em busca de uma parede em um descampado. Porque não em versos? Não dá. E porque não em página, papel branco, palpável, concreto? Não posso. O vazio se expressa no vazio. A página que quero preencher: vazia, persiste. O fado: não conseguir o que quero, ter o que não me interessa. O que resta: prostituição intelectual. Vender-me barato, ao primeiro que vier. Voltar atrás? Não dá. Os dois pés já caminharam para o vazio. A queda é livre. Acabou a irreverência.

Um comentário:

Camilíssima Furtado disse...

Perfeito, texto maravilhoso e imagem igualmente maravilhosa. Lindas palavras... Me inspiraram para um poema...Viva a intertextualidade!